CRÔNICA: DENTRO OU FORA DE MIM
CRÔNICA: DENTRO OU FORA DE MIM
Tércio
Inácio Jung
Parece-me que os filósofos antigos tinham razão ao afirmar que o ócio é necessário para filosofar (E a Hannah Arendt também ao dizer que é no exterior/estrangeiro que o “estar sozinho” é possível). Eu diria que não é o ócio em si, mas, no momento do ócio a abertura à intuição que faz a filosofia brotar.
Mas não é sobre isto que quero falar nesta crônica. A questão que me veio hoje, no momento do ócio, concatenada de outra forma, pois já venho pensando, lendo, meditando, constelando, fazendo terapia, meditando de novo ...sobre - a algum tempo - é a seguinte: O QUE ESTÁ DENTRO DE MIM E O QUE ESTÁ FORA DE MIM?
Sou católico de berço, estudei inclusive em juvenato de Irmãos (instituição da Igreja Católica semelhante ao seminário de Padres), mas atualmente também tenho grande interesse pelo budismo, ou melhor, pela meditação budista. Aliás, foi graças às práticas católicas e budistas que também percebi a diferença entre as religiões tradicionais e a “filosofia budista”, ou seja, enquanto nas religiões se busca algo fora de si (o salvador e a vida eterna), no budismo o desafio é encontrar isto - ou algo do gênero - dentro de si.
Não preciso argumentar alongadamente aqui que o foco da terapia (Psicologia) também é semelhante ao do budismo, ou seja, a tristeza e a alegria, a depressão e o equilíbrio estão dentro de você e não fora. Não adianta buscar culpados fora de mim. Fora de mim posso buscar pistas e os indícios que poderão me levar às causas internas. Lembrei agora de um exemplo que um Irmão - daquele juvenato - gostava de repetir: quando ascende a luz da reserva de combustível no painel do carro, não adianta eu ir num eletricista,por achar que o problema é a luz do painel, preciso ir num posto e abastecer.
Veio-me uma provocação agora a partir do exemplo anterior: será que as religiões dogmáticas não estão buscando um super-eletricista? E assim, certos e ocupados nesta busca, nem se dão conta que a causa é outra, ou melhor, a causa que com certeza está dentro deles é outra (sugiro minha crônica: No vale da morte e das sombras).
Entretanto, a partir da temática apresentada, ando pensando sobre a questão do conhecimento científico, ou seja, parece-me que as teorias científicas estão mais fora de mim do que dentro de mim, ao menos em sua amplitude e num primeiro momento. Até porque, antes de mim já existe toda uma tradição cultural de saberes e depois de mim continuará existindo.
No entanto, sou eu que me proponho e disponho a internalizá-la, ao menos em parte. E qual é a parte que me interessa e que buscarei internalizar também sou eu que defino. Convém dizer que esta definição (me refiro aqui a um curso de graduação) ocorre numa fase imatura da nossa curta existência; fase em que pesa (isto está dentro de mim), geralmente, a necessidade de emprego e não o interesse pelo saber e/ou pelas ciências.
Como o atual sistema de ensino institucionalizado/Universitário está quase que exclusivamente, fundado sobre a “apresentação” de conhecimentos por parte dos professores, evidencia-se mais ainda a questão de que o conhecimento científico está fora de mim, até que eu decida por internalizá-lo. Internalização que depende da minha estrutura hermenêutica, já que grande parte das teorias científicas são apresentadas de forma oral e/ou escrita. Entretanto, o apresentador da teoria (ou professor), pode fazer o melhor show pirotécnico, ou ainda, como geralmente acontece, deixar claro que na prova/exame é ele que manda e vai “se cobrar” (mais “se cobrar” do que cobrar o conhecimento), mas a internalização ainda dependerá de cada um, afinal – infelizmente ou FELIZMENTE - ninguém pode aprender pelo outro.
Ninguém pode fazer a internalização por mim; assim como cada um irá descobrindo – conscientemente - o mundo pelo uso dos próprios sentidos, também cada um precisa dar seus passos hermenêuticos numa comunidade argumentativa de saberes científicos (a argumentação e a cientificidade distingue a Universidade das outras comunidades comunicativas).
Confesso aqui que, quando morre um grande intelectual eu penso com meus botões: uma pena ele carregar tanto conhecimento com ele.Quem sabe, no futuro, criem uma forma de fazer backup de cérebros avantajados, hehe.
(Preciso aproveitar a ocasião para dizer que a diferença entre ética e moral também é possível a partir desta temática: a ética é subjetiva, logo, construção interna; já a moral é intersubjetiva, ou melhor, está mais fora de mim).
Enfim, há um mundo humano e cultural que pode ser acessado (o que a Universidade atual oportuniza em relação ao legado de teorias científicas), mas, só depois de internalizado é que este mundo poderá revitalizar-se através de mim.
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