Ensaio - SER INTELIGENTE (natureza/totalidade) É BEM DIFERENTE DE SER RACIONAL (pensar relacionando “fenômenos”/partes)
PARTE I
MUNDO DA NATUREZA (matéria + estrutura) X RAZÃO HUMANA (forma)
Partindo da provocativa afirmação do filósofo alemão Sloterdijk (o ser humano não passa de um animal que não deu certo) e de mais uma instigante reflexão do nosso grupo de estudos, encampada pelo filósofo santoangelense Paulo Leal, cheguei a uma modesta conclusão sobre a nossa condição de animais racionais iludidos (além de prematuros e carentes, mas isso não abordarei aqui) desse Planeta.
Tentar entender “como pensamos” é a busca do Paulo - assim como já foi de muitos outros filósofos - e o motivo da criação e existência do nosso grupo de estudos desde 2006, ou seja, lá se vão 15 anos de debates em torno dessa temática.
Disso tudo, uma intuição intrigante me ocorreu. Nas últimas reuniões o Paulo anda falando, também, sobre as condições da matéria e da forma que atravessam e sustentam o nosso pensar, ou, como ele prefere, a nossa competência de relacionar as memórias das sensações. Pois, para o Paulo, é através dos nossos 7 sentidos (isso mesmo, 7 e não só 5: tato, olfato, paladar, visão, audição e ainda o de sobrevivência e o de reprodução) que experienciamos/conhecemos o mundo da natureza; disso resultam as memórias que ficam impressas em nosso cérebro; e quando pensamos, apenas relacionamos as memórias que temos impressas, ou melhor, não pensamos os objetos concretos e reais, mas, pensamos relacionando, apenas, memórias/símbolos/ideias.
A partir disso, dos 15 anos de debates – afinal, nada se cria, mas, tudo se movimenta - a minha intuição: concordo com o Paulo e com os empiristas, anteriores a ele, que, de fato, conhecemos através do nosso contato com o mundo da natureza, contato que fazemos através dos nossos sentidos, ou melhor, eu com os meus e você com os teus sentidos. Isso já evidencia que cada um tem a sua experiência do mundo da natureza (o que é bem diferente com o mundo cultural humano, “cultura” que pode ser transmitida através da linguagem - nosso limitada educação institucionalizada – mas isso, deixo para mais adiante).
Concordo ainda, que a partir do meu contato empírico, por meio dos meus sentidos, terei muitas sensações orgânicas, ou melhor, poderei experienciar muitas sensações em contato com o objeto material/concreto/real. Entretanto, amanhã, ao lembrar isso, não lembrarei do objeto em si, mas, lembrarei apenas, das memórias internalizadas, lembrarei (mas não sentirei) aquelas sensações que tive, sendo assim, não carrego objetos na mente, mas apenas memórias das minhas sensações.
Isso posto, e lembrando de uma interminável discussão entre empiristas e racionalistas, que Kant buscou amenizar, a respeito do conhecimento dos objetos, ou melhor, se eram os objetos que imprimiam algo na razão ou se era esta que extrairia algo daqueles... venho propor o seguinte:
1. Os objetos – e tudo no mundo da natureza - têm matéria estrutura
2. Através dos sentidos, conseguimos entrar em contato com a matéria e a estrutura dos objetos
3. Entretanto, apenas “retemos” em nossa razão, as estruturas dos objetos, transformadas em formas, jamais a matéria também
4. Logo, ao pensar - e ao falar - tratamos apenas de formas, ou seja, de uma parte do objeto todo, que é matéria e estrutura.
Vou dar alguns exemplos para ilustrar:
A força da gravidade sempre existiu, sempre esteve aqui, no mundo da natureza, como matéria e com sua estrutura - todos já a sentiam diariamente - mas, só em 1666, Newton captou/entendeu, também, a estrutura dela, ao trazê-la para o mundo racional humano, na medida em que a transformou em pensamento e linguagem; ou seja, Newton não inventou nada, ele apenas experienciou a matéria, notou a estrutura da gravidade e a converteu em forma de pensamento e linguagem.
Outro exemplo, que me ocorre no momento, é o do número “PI” (3,14...), ou seja, ele sempre existiu e foi o número que representa o resultado da divisão entre o perímetro e o diâmetro de um círculo, mas, foi o matemático Arquimedes, que viveu na Grécia entre 287 a.C e 212 a.C. quem chegou à estrutura do “PI”, transformando-o em mundo humano/forma no momento em que o pensou e falou dele.
A partir desses exemplos gostaria de evidenciar que uma coisa é o que pensamos e falamos a respeito do mundo da natureza/dos objetos e que outra questão é a existência real deles. E que, achar que a razão pode entender e “dominar” o mundo da natureza é muito mais empobrecedor do que qualquer outra coisa.
Afastar-nos do mundo da natureza e idolatrar a razão e a linguagem
(mundo humano), já é fruto de uma mente que só opera a partir das formas,
afastada da realidade que é matéria e estrutura.Considerar a razão a nossa "terra firme" é como pisar no assoalho de um avião, que está a 4000 metros de altura e achar que está pisando em terra firme.
Que a razão já nos enfeitiçou e que a linguagem nos enlouquece hodiernamente, como diz o Paulo, disto não há dúvidas. A loucura e a ilusão humana é tanta, que achamos que a natureza está a nosso serviço e que o nós, animais racionais, somos o motivo da Criação (ilusão dentro de ilusão). Sloterdijk afirma que o ser humano não passa de um animal que não deu certo e eu digo que é o único animal que se ilude a partir do uso da razão e da linguagem.
Sendo assim, cai por terra a coroa majestática da razão humana, assim como a da linguagem, afinal elas só tratam de formas e nunca dos objetos em si, que são matéria e estrutura. Ainda, ao pensarmos e falarmos do mundo natural estamos apenas falando das formas dele que retemos em nossas mentes, ou pior, eu falo a partir das minhas formas e você me ouve a partir das tuas formas internalizadas. Além de estarmos longe do mundo da natureza/do objeto em questão, ainda utilizamos formas diferentes como base para um possível entendimento. Felizmente, como ambos vivemos no mundo humano das formas, conseguimos nos entender, afinal, ambos habitamos o mundo das ilusões humanas (para provocar: não estaria localizado aqui a sede das religiões?).
Agora, certamente, vários estão se inquirindo: mas e qual a utilidade disso na vida diária, na existência real? Ao que respondo: “utilidade” já é um critério humano de forma; segundo, saber que a vida real, a nossa vida natural tem um sentido fundante, diferente do ilusório que insistimos em lhe imputar, pode ser muito deprimente para nós humanos; terceiro, saber que ao pensar e/ou ao falar tratamos apenas da forma, ou seja, de parte do mundo real e natural – este que é matéria e estrutura– pode ser tão difícil de aceitar como o heliocentrismo foi. Aliás, em tempo podemos perceber que, “a razão” não é o centro, em torno do qual o mundo humano deve girar, afinal, jamais ela foi o centro em torno do qual mundo da natureza girou/gira.
Ainda acrescento, que saber como pensamos (a razão) é apenas uma das partes que nos constituem, assim como os sentidos são outra parte, a afetividade é outra, a intuição é outra, o instinto é outra... e nenhum deles é “a” mais importante, mas todas, simplesmente, são mundo da natureza.
Por fim afirmo, o mundo da natureza não precisa do nosso mundinho humano, mas nós sim, dependemos do mundo da natureza. CONSCIENTIZEMO-NOS DISSO.
PARTE II
NOSSA CONDIÇÃO HUMANA
Nossa infraestrutura é de corpo “animado” (animal) e nossa superestrutura é de corpo animado que pensa (e fala)
Semelhante aos animais e as plantas, é o corpo orgânico que nos enraíza no aqui e no agora, no mundo da natureza, no mundo da matéria viva (que também tem forma/formas). Entretanto, diferente dos animais e das plantas, conseguimos desenvolver a capacidade de tomar consciência daquela condição, logo, desenvolvemos uma segunda condição.
Assim como todas as espécies de animais, temos um corpo orgânico que dispõe, por natureza, de sentidos sensoriais e de um instinto que permitem a existência desse corpo nesse organismo-Planeta (em outros Planetas já é outra conversa). Inclusive, os nossos corpos dispõem dos mesmos sentidos sensoriais (tato, olfato, paladar, audição e visão), e do mesmo instinto de autopreservação – Hume já o havia compreendido – instinto que implica na conservação (alimentar/proteger o corpo) e na manutenção (reprodução no corpo e de corpos).
Possivelmente, todos estamos de acordo em relação aos cinco sentidos sensoriais, já o instinto de autopreservação, acredito que requer uma melhor apresentação: primeiramente, ele nos equipara aos demais animais e as plantas; enquanto tivermos corpo orgânico, esse instinto nos conduzirá sempre para à vida, que é preservação e reprodução (me parece que aqui temos a sede da dor e do prazer, ou seja, fugir da dor seria evitar a fome, danos/sensações dolorosas, sobreviver e buscar o prazer seria a busca de sensações agradáveis, como, por exemplo, as sexuais).
Sendo assim, também seria possível, a meu ver, suspeitar que o instinto da autopreservação seja a base para a nossa – humana - condição afetiva, e ambas, formariam uma infraestrutura para o desenvolvimento da nossa condição racional. Estas condições, a afetiva e a racional, começam a nos diferenciar dos demais animais e das plantas.
Enfim, convém lembrar que aquela é nossa condição natural, nossa condição de corpo/organismo no planeta Terra (que também é um organismo vivo), assim como a dos animais em geral e, em certa medida, assim como a das plantas. Mas, e o que nos diferencia dos animais?
A resposta é simples: o que nos diferencia é a capacidade de “sentirmos” essa inquietação e de fazermos essa pergunta (e muitas outras, é claro). Disso decorre uma recordação do filósofo Schelling, da afirmação dele: que em nós a natureza se tornou/torna autoconsciente. Ao que eu acrescentaria: e afetiva.
A partir do brevemente exposto, já é possível desconfiar da venerada supremacia racional em nós humanos. Reforço que, ela apenas nos diferencia das outras espécies, assim como uma ave é bem diferente de um cachorro, ou de um peixe, ou de uma árvore. Aliás, a inteligência está em todos e a racionalidade só em nós.
Quem sabe até seria melhor usar o termo “inteligência natural” (ou o termo kantiano de razão prática?) no lugar de instinto natural. Como já argumentei em outra divagação, é pela nossa condição natural (inteligência) que agimos e pela razão nós humanos apenas reagimos, ou seja, os animais e as plantas – a natureza toda – são sempre inteligentes, nós humanos, nem sempre, geralmente, apenas reagimos racionalmente.
Algumas intuições sobre essa nossa condição racional:
Como já disse anteriormente, é pela nossa condição racional que fazemos as perguntas; mas, e por que perguntamos? Penso que perguntamos por que sentimos a insegurança/a falta e queremos conhecer, afinal, diferente dos demais animais, não nos satisfazemos apenas em agir naturalmente e em agir instante por instante. Nós, seres racionais, também reagimos, sobretudo às “carências”, e para reagir é necessário conhecer e entender.
Conhecendo e entendendo:
Os objetos tem matéria e forma (forma dada/a priori, independente de nós), mas, a nossa capacidade racional, alimentada pelos 5 sentidos (sentidos que experienciam a matéria e a forma dada/natural), também tem formas criadas/a posteriori, através das quais a razão “fomata” (codifica em símbolos racionais-linguisticos), os resultados das experiências dos sentidos, assim como a condição afetiva formata (em sentimentos) as vivências de autopreservação.
Mas a razão ainda acaba/acabou gerando as próprias formas mentais, independentes de uma matéria e estrutura natural. Por exemplo: o tempo cronometrado é uma formatação/codificação racional para o movimento no espaço, ou seja, no Universo existe o movimento no espaço, que é forma natural, (a Terra que gira sobre seu eixo e em torno do sol... inclusive, o meu desenvolvimento orgânico, enquanto corpo, é movimento natural), bem diferente da forma racional de tempo cronológico que lhe atribuímos. Já outro exemplo, de algo que só existe no mundo racional humano, é o dinheiro, ou melhor, ele apenas existe na forma mental (será que os deuses também não existem apenas na forma mental?).
Mas, e a condição afetiva, a normalmente esquecida, sobretudo no mundo filosófico?
Pelo exposto até o momento, me parece razoável, de fato, que a nossa condição afetiva tem suas raízes na inteligência da natureza, ou seja, na lei natural da autopreservação. Claro que as três (instintiva, afetiva e racional) estão interligadas diretamente e em constante movimento (seria a nossa “alma” o fruto desse processo/movimento interativo?). Ou, a alma, o espírito... também seriam apenas formas da mente humana? Lembrando que os animais – e as plantas – também são corpos animados.
Que os animais não pensam é passível de aceitação, entretanto, que não sentem afetivamente já é mais difícil.
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PARTE IIISER INTELIGENTE (natureza/totalidade) É BEM DIFERENTE DE SER RACIONAL (pensar relacionando “fenômenos”/partes)
Nossa infraestrutura é de corpo “animado” (animal) e nossa superestrutura é de corpo animado que pensa (e fala)
Semelhante aos animais e as plantas, é o corpo orgânico que nos enraíza no aqui e no agora, no mundo da natureza, no mundo da matéria viva (que também tem forma/formas). Entretanto, diferente dos animais e das plantas, conseguimos desenvolver a capacidade de tomar consciência daquela condição, logo, desenvolvemos uma segunda condição.
Assim como todas as espécies de animais, temos um corpo orgânico que dispõe, por natureza, de sentidos sensoriais e de um instinto que permitem a existência desse corpo nesse organismo-Planeta (em outros Planetas já é outra conversa). Inclusive, os nossos corpos dispõem dos mesmos sentidos sensoriais (tato, olfato, paladar, audição e visão), e do mesmo instinto de autopreservação – Hume já o havia compreendido – instinto que implica na conservação (alimentar/proteger-se) e na manutenção (reprodução no corpo e de corpos).
Possivelmente, todos estamos de acordo em relação aos cinco sentidos sensoriais, já o instinto de autopreservação, acredito que requer uma melhor apresentação: primeiramente, ele nos equipara aos demais animais e as plantas; enquanto tivermos corpo orgânico, esse instinto nos conduzirá sempre para o movimento/à vida, que é preservação e reprodução (me parece que aqui temos a sede da dor e do prazer, ou seja, fugir da dor seria evitar a fome, danos/sensações dolorosas, sobreviver e buscar o prazer seria a busca de sensações agradáveis, como, por exemplo, as sexuais).
Sendo assim, também seria possível, a meu ver, suspeitar que o instinto da autopreservação seja a base para a nossa – humana - condição afetiva, e ambas, formariam uma infraestrutura para o desenvolvimento da nossa condição racional. Estas condições, a afetiva e a racional, começam a nos diferenciar dos demais animais e das plantas.
Enfim, convém lembrar que aquela é nossa condição natural, nossa condição de corpo/organismo no planeta Terra (que também é um organismo vivo), assim como a dos animais em geral e, em certa medida, como a das plantas. Mas, e o que nos diferencia dos animais?
A resposta é simples: o que nos diferencia é a capacidade de “sentirmos” essa inquietação e de fazermos essa pergunta (e muitas outras, é claro). Disso decorre uma recordação do filósofo Schelling, da afirmação dele: que em nós a natureza se tornou/torna autoconsciente. Ao que eu acrescentaria: e afetiva.
A partir do brevemente exposto, já é possível desconfiar da venerada supremacia racional em nós humanos. Reforço que, ela apenas nos diferencia das outras espécies, assim como uma ave é bem diferente de um cachorro, ou de um peixe, ou de uma árvore. Aliás, a inteligência está em todos e a racionalidade só em nós.
Quem sabe até seria melhor usar o termo “inteligência natural” (ou o termo kantiano de razão prática?) no lugar de instinto natural. Como já argumentei em outra divagação, é pela nossa condição natural (inteligência) que agimos e pela razão nós humanos apenas reagimos, ou seja, os animais e as plantas – a natureza toda – são sempre inteligentes, nós humanos, nem sempre, geralmente, apenas reagimos racionalmente.
Algumas intuições sobre essa nossa condição racional:
Como já disse anteriormente, é pela nossa condição racional que fazemos as perguntas; mas, e por que perguntamos? Penso que perguntamos por que sentimos a insegurança/a falta e queremos conhecer, afinal, diferente dos demais animais, não nos satisfazemos apenas em agir naturalmente e em agir instante por instante. Nós, seres racionais, também reagimos, sobretudo às “carências/faltas”, e para reagir é necessário conhecer e entender.
Conhecendo e entendendo:
Os objetos tem matéria e estrutura (estrutura natural/a priori, independente de nós), mas, a nossa capacidade racional, alimentada pelos 5 sentidos (sentidos que experienciam a matéria e a estrutura natural), só consegue criar formas mentais, a posteriori, através das quais a razão “fomata” (codifica em símbolos racionais-linguísticos), os resultados das experiências dos sentidos, assim como a condição afetiva formata (em sentimentos/juízos) as vivências de autopreservação.
Mas a razão ainda acaba/acabou gerando as próprias formas mentais, independentes de uma matéria e estrutura natural. Por exemplo: o tempo cronometrado é uma formatação/codificação racional para o movimento no espaço, ou seja, no Universo existe o movimento no espaço, que é forma natural, (a Terra que gira sobre seu eixo e em torno do sol... inclusive, o meu desenvolvimento orgânico, enquanto corpo, é movimento natural), bem diferente da forma racional de tempo cronológico que lhe atribuímos.
Outro exemplo: os números são criação da competência racional, pois, na natureza, só existe a estrutura natural da “quantidade” nos/dos objetos. Essa “quantificação em números”, acabou resultando numa criação de algo que só existe no mundo racional humano, que é o dinheiro, ou melhor, não tem matéria/corpo e estrutura natural (será que os deuses também não existem apenas no mundo racional humano?).
Mas, e a condição afetiva, a normalmente esquecida, sobretudo no mundo filosófico?
Pelo exposto até o momento, me parece razoável, de fato, que a nossa condição afetiva tem suas raízes na inteligência da natureza, ou seja, na lei natural da autopreservação. Claro que as três (instintiva, afetiva e racional) estão interligadas diretamente e em constante movimento (seria a nossa “alma” o fruto desse processo/movimento interativo?). Ou, a alma, o espírito... também seriam apenas formas da mente humana? Lembrando que os animais – e as plantas – também são corpos animados.
Tércio
Inácio
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